No dia da independência americana, empresas da Web protestam sobre arapongagens da NSA
Neste 4 de julho, os americanos comemoram a independência do país do domínio inglês. É uma data celebrada com muito civismo, quando são lembrados os fundadores da nação e os princípios fundamentais consagrados na Constituição. Inclusive os da liberdade individual e da privacidade.
O inusitado neste ano de 2013 é o protesto coletivo de grandes empresas da internet, como a WordPress (plataforma de blogs) e a Fundação Mozilla (criadora do browser Firefox), contra as ações secretas da NSA, que fizeram -e seguem fazendo, tudo indica- um amplo programa de monitoramento de ligações telefônicas e do uso da internet por cidadãos mundo afora, aí incluidos os americanos.
Anúncios na TV aberta e paga também estão sendo veiculados, a exemplo de um video que já rola no YouTube, chamando a atenção dos americanos sobre a violação, pelo governo, da 4ª emenda à Constituição, justamente a que assegura aos cidadãos o direito inalienável à privacidade.
Embora as gigantes Facebook, Apple, Twitter, Verizon e Google não façam coro nesse episódio, elas já haviam criticado essas medidas anteriormente, mas de forma discreta, muito mais para dar satisfação a seus clientes, mais de 1 bilhão deles. Foi mais para explicar que elas forneciam dados para a NSA sob ordens judiciais secretas, que acabaram vazando por artes do ex-colaborador Edward Snowden, através de reportagem do Daily Telegraph britânico.
A mobilização corporativa pela internet contra ações do governo não é coisa nova, nos Estados Unidos. Mas essa contra a arapongagem da NSA está ancorada na grande e aparentemente infindável discussão sobre a essência da liberdade que a internet representa contra a missão que o governo tem na luta contra o terrorismo.
Enquanto isso, Julian Assange, o vasador-mor do WikiLeaks segue há meses abrigado na embaixada do Equador em Londres, e Edward Snowden aguarda desde 23 de junho, no aeroporto de Moscou, a concessão de asilo político já feito a vários países.
É de lá que Snowden ameaça fazer novas divulgações sobre as artes da NSA, em carta dirigida ao presidente Rafael Correa, do Equador, conforme mostrou a agência Reuters.
Mas qualquer que seja a repercussão do protesto das empresas no dia da independência americana, ou as novidades que possam ser reveladas por Assange ou por Snowden, parece que o contraponto liberdade x segurança foi alçado a um novo patamar.
Até George Orwell ficaria encabulado…
Agora é oficial: Estamos sendo grampeados por agências de inteligência americanas e britânicas, no mínimo! Registros de ligações telefônicas, bases de dados das principais redes sociais e serviços online, tudo isso está sendo monitorado.
Os registros de todas as ligações telefônicas dos clientes corporativos da Verizon estão sendo entregues à NSA – National Security Agency por ordem do juiz Roger Vinson desde abril deste ano. São chamadas locais, longa distância nacional e internacional. O furo inicial foi dado pelo jornal inglês TheGuardian, que inclusive exibiu cópia da ordem judicial secreta .
Na sequência, a Casa Branca admitiu as ações, por conta das medidas de combate ao terrorismo, e aparentemente, o monitoramento vai continuar e, quem sabe, também esteja sendo feito por outras organizações mundo afora.
Mas olhemos a coisa do prisma tecnológico: A internet, é bom lembrar, é a derivada civil da ArpaNet, uma rede comunicação entre computadores militares criada na década de 1960 por conta da Guerra Fria e da necessidade estratégica de blindar informações sensíveis que trafegavam através de redes comerciais de telecomunicações, como a AT&T nos Estados Unidos.
Com sua expansão para uma rede mundial, e a popularização dos celulares, bilhões de pessoas se conectaram. Liberdade, baixo custo, informação farta à disposição.
Do lado dos indivíduos, a banda larga por onde cada vez mais dados trafegam velozmente; custos de armazenamento em queda livre, e serviços ditos na nuvem cada vez mais populares; os processadores dos dispositivos digitais sempre mais poderosos.
Do lado das agências de inteligência, a realidade é a mesma: Rede rápida, processadores parrudos, armazenamento de dados em escala de zetabytes. E é bem mais fácil de fazer, pelo acesso antecipado às novas tecnologias. A pressão para grampear é grande, e se as agências oficiais não fazem, os bandidos podem sair na frente.
Em 1948, George Orwell escreveu 1984, onde antecipava com seu Big Brother um futuro com um ente central opressor, que sabia da atividade de todos os indivíduos.
A realidade de 2013, se pudesse chegar à tumba de George Orwell, faria com que ele desse boas reviradas de desconforto, ao verificar que sua imaginação não conseguiu ser suficientemente criativa na sua fantasia do futuro.
Os estrelados, suas namoradas, seus e-mails e a neutralidade da web
General Petraeus – cortesia philly.com
Então, agora temos uma realidade mais criativa do que a ficção: O estrelado general Petraeus, agora ex-chefão da CIA, sua biógrafa e namorada, o agora ex-futuro comandante das forças americanas no Afeganistão, o também estrelado general Allen e sua namorada. Elas disputando estrelas -e, com certeza, mais coisas- dos generais, ambos casados com sua esposas há décadas, respeitados na hierarquia militar, flagrados nas trocas de e-mails os mais picantes revelando segredos de alcova, se é que existem alcovas hoje em dia.
Detalhe: ambos os militares são depositários de relevantes informações relativas à segurança nacional americana e, claro, à segurança global. Ou seja, se e-mails deles podem vazar e comprometer suas carreiras, imagine os nossos!
E não só e-mails, mas também perfis em redes sociais, nossos dados pessoais, financeiros, documentos familiares, profissionais, o que seja.
Enquanto isso, no Congresso brasileiro e em outras casas de leis e em organismos multilaterais mundo afora discutem-se se, como, quanto e quando a internet e o mundo digital precisam ser regulados, em que circunstâncias o que é meu e o seu podem ser tornados públicos sem quebra da lei, o que deve ser aberto em prol do bem público, quem pode controlar, bisbilhotar, invadir.
A polêmica em torno dos generais e de suas estrelas companheiras de travesseiro é centrada em saber se informações sensíveis e confidenciais de segurança vazaram, ou seja, se as meninas podem ter sido, de uma forma ou de outra, uma versão século 21 de Mata Hari, famosa espiã.
A lei brasileira vai ter muitos desdobramentos ainda, no Congresso Nacional, até sua eventual aprovação. Depois chega a vez dos decretos, portarias e resoluções normativas que detalham a lei. Seguem-se as contestações no Judiciário, as revisões da lei, decretos, portarias e resoluções, tratados internacionais, e por aí vamos.
Em um mundo que gera 2,5 quintilhões de bytes por dia, e onde 90% de todos os dados gerados pela humanidade foram acumulados nos últimos dois anos, segundo Nate Silver em seu genial livro The Signal and The Noise, devemos nos dar conta que nossos dados não públicos tendem a zero, se já não chegaram lá. A dúvida é como fazer para preservar um mínimo do que imaginamos ser privacidade.
Na discussão do Congresso Nacional, um impasse se dá em torno das excessões da neutralidade da web, como no caso de catástrofes naturais ou da investigação de possíveis crimes. Como o termo neutralidade é pinçado para ser o equivalente, na Constituição, da igualdade que teríamos todos perante a lei, já dá para ver o tamanho da encrenca para chegarmos a um consenso que seja tornado lei e que essa lei seja aplicável.
Enquanto isso, melhor cuidar do nosso. Se os mails desses dois generais estrelados não eram seguros…
Cúmulo da Ironia: Entidade de Defesa do Consumidor "Ataca" o Consumidor
Recebi uma chamada do call center da Proteste, que se diz entidade de defesa do consumidor. Eles usaram meus dados obtidos em algum lugar para tentar me vender seu peixe. Como uma entidade que prega a defesa do consumidor pode comprar listas de nomes para vender seu peixe?
Já não bastasse a quantidade de chamadas que recebemos a partir de scripts que surgem nas telas dos(as) sofridos profissionais, que trabalham muito e ganham miséria, agora essa entidade de defesa resolve jogar no ataque.
Esses aspectos de proteção dos dados pessoais sempre estão no topo das prioridades quando se discutem, por exemplo, os Termos de Uso e Políticas de Privacidade de redes sociais ou portais de compras. Normalmente aceitamos esses termos sem lê-los, e é possível que essa entidade tenha agido dentro da lei, por ter obtido meus dados em um cadastro de alguma empresa onde eu “concordei”, sem ler, com a cessão dos mesmos a terceiros.
Como fazer para evitar aborrecimentos como esse, não só da Proteste e não só para mim?
