Sou veterano o suficiente para me lembrar de 17 Copas do Mundo. E, à falta de bons motivos para tirar a má impressão que tive na outra Copa aqui no Brasil, a de 1950, vou contar aqui minhas impressões da evolução da tecnologia nesse período de 64 anos, e da participação da massa de cidadãos e torcedores.
1950: No Rio, com 9 anos, morava em Ipanema, a exatos 13,4 km do Maracanã (hoje), ou 21 km, pelo caminho então disponível. Para wuem não tinha entrada para a final, o jeito era ouvir pelo rádio. Eu ouvia a rádio Continental em AM, e o locutor era Oduvado Cozzi, comentários de Ary Barrozo. Uruguai 2×1: Pude sentir o silêncio ensurdecedor na cidade.
1954: Na Suiça, outro mico, dessa vez ouvido em ondas curtas, sinal ruim, mas, mesmo assim, dava para entender que não era a hora do Brasil. As poucas imagens que vinham eram telefotos bem distorcidas, nos jornais do dia seguinte, e alguns vídeos nos jornais semanais nos cinemas. Alemanha Ocidental passa pela fenomenal Hungria, de Puskas.
1958: a Copa da Suécia, do Pelé, do Vicente Feola, do fim do complexo de vira-latas, ainda pelo rádio. Para os poucos que tinham TV em casa, a solução era assistir a uma apresentação de slides na TV Tupi, enquanto o mesmo narrador do rádio passava sua voz nos altofalantes da TV.
1962: No Chile, o bicampeonato, a sensação do poder absoluto do Brasil no esporte bretão, onde seguíamos de novo pelo rádio e, no dia seguinte, alguns vídeos pela TV, vindos de avião.
1966: o vexame na Inglaterra, a frustração do tri, poucas imagens pela TV no dia seguinte, já vindas por transmissão via satélite, mas nada de todos os jogos ao vivo, ao menos em Curitiba, onde morava e estava no começo de minha carreira profissional. A dona da casa levanta a Jules Rimet, mas se houvesse a tecnologia de hoje da detecção da bola passando pela linha de gol, a Alemanha seria bicampeã.
1970: a Copa no México, a Copa do Tri, da seleção de Pelé, Jairzinho, Gerson, Tostão e tantos outros, a primeira transmitida ao vivo, via satélite e em cores, mas o Brasil ainda não dispunha de um sistema de difusão de sinais coloridos. O jeito era assistir os jogos na TV de tela pequena, em preto e branco. A novidade era o replay, com duas câmeras atrás de cada gol com um gravador de videocassete, cada um custando, à época, a fortuna de US$ 100 mil, algo como US$ 1 milhão em grana de hoje. Euforia geral no Brasil governado por militares, o “prá frente Brasil”
1974: Já com boa parte da população brasileira com televisores em casa e com uma pequena parcela tendo o privilégio de contar com um possante 21″ em cores, a nossa carrasca Alemanha (à época, ainda Alemanha Ocidental) conquistar o bi em casa. O Tetra nosso ainda levaria 20 anos para chegar.
1978: Nada a comemorar. Ainda com o regime fechado por aqui, a Argentina levantava a taça pela primeira vez. Do ponto de vista tecnológico, evolução na quantidade de aparelhos em cores e da cobertura para recepção do sinal ao vivo.
1982: Na Espanha, a anfitriã é a segunda seleção a perder uma Copa em casa, para a Itália, sofrendo um Bernabeusazo, ou algo parecido. Nós, com a melhor seleção de todos os tempos, seguimos os passos e os passes de nós mesmos (1950), Hungria (1954) e Holanda (1974). E alguns de nós já podíamos ter um aparelho de videocassete em casa, qu enos permitia gravar os jogos para ver e rever o título que não aconteceu.
1986: A Colômbia desiste de sediar o mundial e o México faz sua segunda Copa, e a Argentina sua segunda festa. E nós passamos a ter de engolir o Maradona. Tecnologia nova? Os CDs apareciam, mas só os players. Para vevídeos, só nos videocassetes. O Brasil, bem… caiu que nem o Plano Cruzado, que bombava à época e deu no que deu.
1990: Era para ser nossa, mas a Alemanha fez o dever de casa e conquistou o Tri, em cima da Argentina, na casa dos italianos. De tecnologia, só mais câmeras transmitindo, mais replays, o slow-motion, e pronto. Já haviam computadores domésticos, mas, para efeitos esportivos, apenas com planilhas eletrônicas para analisar os números da Copa e jogar alguns games rústicos de futebol.
1994: Nos Estados Unidos, com Romário & Cia, o Tetra! E o DVD aparecia, para podermos colecionar vídeos da Copa com melhor qualidade do que as transmissões por TV aberta. Alguns poucos já podiam desfrutar de computadores domésticos, com comunicação por telefone, fazendo chats através de serviços de BBS e do ICQ. As buscas na Internet estavam na moda, e o Yahoo! começava seu domínio.
1998: Vive la France, Ronaldo deu chabú e conquistamos o bi-vice. Já dava para ter a internet por linha discada a incríveis 64kb, mas a conta (para variar) era salgada. Mas os serviços de chat eram populares e dava para se comunicar com o mundo, tendo, pela primeira vez, uma visão global da Copa, de forma direta. Nascia o Google!
2002: O Penta, do outro lado do mundo, a reabilitação de Ronaldo e a glória de Felipão. Foram 2 títulos na América do Norte (México e EUA), um na América do Sul (Chile), um na Europa (Suécia) e esse na Ásia (Japão e Coréia do Sul). O Google era rei e a banda larga descongestionava as linhas telefônicas. Muita mensagem trocada por SMS.
2006: Com o Google bombando, o Orkut mandava ver no Brasil, mas o Facebook vinha com tudo. A Alemanha fazia seu tri na Itália. O Brasil, bem… já que não deu para sediar uma Copa, o jeito era tentar no ano seguinte ganhar o direito e receber as seleções em 2014. Smartphones apareciam no radar.
2010: Na África do Sul, surgia o Cometa Espanha, imbatível pelos próximos… (vide 2014). Já era possível fazer videoconferências pelo computador, o Skype era soberano na telefonia IP grátis, o Facebook tomava conta das redes sociais, mas o Twitter era o grande contendor a bater na troca de mensagens instantâneas. Alguém aí se atreve a repetir a escalação base do Brasil de Dunga?
2014: Antes da final, dá para escrever que a Copa no Brasil foi um sucesso, os gringos gostaram, embora as redes de comunicação não estivessem no Padrão Fifa, ainda assim deu para postar milhões de fotos e vídeos dos estádios. Em alguns pontos, a transmissão de imagens 4K, bem mais nítidas do que as Full HD, estas chegarando em massa aqui em nossas plagas nesse ano da Copa, mas que já eram padrão em 2010. Os jogos, todos pela TV ao vivo e com as redes sociais bombando, mostrou o esquema planetário desse evento FIFA, muito mais do que 64 jogos de futebol.
Na 1ª semifinal, minha neta de nove anos chora de tristeza após o 7×1 da Alemanha. E eu penso: será que o legado de país que minha geração deixa para ela não poderia ser melhor? Ela tem hoje a idade que eu tinha em julho de 1950.
Tomara que ela só tenha esse motivo de chorar pelo Brasil em 2014.
Republicou isso em Conectadose comentado:
E meu comentário ao vivo nesta quarta, 9/7 na CBN Curitiba, com Gabriela Brandalise.